Todo mundo conhece aquele caminho “obrigatório” na carreira de TI, né? Começa como técnico, vira especialista, depois líder, gerente e, se tudo der certo, diretor. Como se subir cada degrau dessa escada fosse a única forma de mostrar que você “venceu na vida”. E no setor público então? Piorou! Conseguir aquele cargo comissionado vira quase uma obsessão coletiva.
Não podemos esquecer também que ser gestor no serviço público é um tipo especial de desafio. Você fica ali, espremido entre processos engessados que ninguém consegue mudar (Síndrome da Gabriela?) e um ambiente onde a política interna frequentemente passa por cima da técnica. No final do dia, ser gestor vira uma verdadeira prova de resistência e resiliência.
Como uma pessoa que sempre foi ansiosa por natureza, descobri que, como líder, eu simplesmente não conseguia “desligar” do trabalho. Saía do “escritório”, mas os problemas vinham comigo: conflitos na equipe, projetos atrasados, preocupações com a organização… tudo isso continuava a povoar meus pensamentos durante o jantar com a família, nos finais de semana e até mesmo em algumas madrugadas insones.
Para cada vantagem que a liderança trazia – tem o seu lado bom que posso compartilhar em outra ocasião, como mais influência, reconhecimento, um salário melhor – havia um preço pessoal escondido. Fazendo as contas, a equação simplesmente não estava fechando.
Percebi que estava cansado de um jogo que já não estava fazendo sentido para mim. As intermináveis disputas por território, as negociações de bastidores, as jogadas políticas… comecei a questionar a ideia de que continuar a ascender na hierarquia é o único caminho válido de crescimento profissional.
Em vez de fazer aquele famoso “quiet quitting” – continuar no cargo fazendo só o mínimo necessário – decidi tomar uma atitude mais honesta. Sentei com minha diretora e abri o jogo: “Olha, neste momento da minha vida, prefiro voltar para uma função mais técnica.” Não porque tenho medo de responsabilidade, mas porque escolhi conscientemente priorizar meu equilíbrio, atualmente. Encontrei compreensão.
Escolhi um reposicionamento ativo, não um afastamento do trabalho. Busquei uma posição onde pudesse contribuir com mais autenticidade e propósito, no momento.
O mais difícil? Encarar aqueles “olhares e dizeres” de estar “voltando atrás” na carreira. Nossa cultura valoriza tanto a progressão linear que qualquer desvio é questionado.
Criei um mantra simples para mim: “é só trabalho”. Isso não significa que não me dedico durante as horas de expediente, mas reconhece que trabalho é apenas uma parte da vida, não a vida inteira. Significa entender que minha saúde mental e satisfação pessoal são tão importantes quanto minha carreira.
Tenho consciência do privilégio que a estabilidade do serviço público me deu para tomar essa decisão sem tanto medo financeiro. Mas acredito também que questionar essa escalada automática na hierarquia vale para outros contextos profissionais.
Espero que essa mudança me ajude a criar limites mais saudáveis entre trabalho e vida pessoal, me permitindo estar realmente presente quando estou em casa e, ironicamente, mais produtivo quando estou no trabalho. Aprendi que sabedoria também é escolher suas batalhas. Às vezes, a decisão mais corajosa não é subir mais um degrau, mas encontrar um caminho que combine com quem você realmente é.
Não descarto que, no futuro, um papel de alta liderança possa fazer mais sentido para mim. O importante é construir uma carreira que tenha significado para você, não para impressionar os outros.
A verdadeira coragem está em reconhecer quando é hora de pegar o caminho menos óbvio, mas mais verdadeiro.